Loading...

“Após ficar doente, fui demitido”

Acho importante se dedicar ao trabalho, mas priorizo a saúde e a família. Cheguei ao Japão em 1990, no início do movimento dekassegui. Vim sozinho, aos 19 anos, com a cara e a coragem. Na época, eu não sabia nada do idioma japonês e, além disso, tive dificuldades para me acostumar com a comida japonesa e para me adaptar à cultura do país.Por causa disso, no meu primeiro ano fiquei praticamente entre o meu apartamento e o trabalho. Evitava sair porque não sabia nem pegar trem e tinha certo medo do “país estranho”. Conforme comecei a aprender nihongo, a partir de meu segundo ano no Japão, passei a sair mais, fui me soltando e adquirindo mais confiança para me adaptar ao país.Sempre morei na província de Aichi. Trabalhei em uma mesma fábrica, em Nishio, durante 15 anos. Lá, eu operava torno e meu trabalho era mais braçal, exigia esforço físico. Há quatro meses, comecei a trabalhar em outra fábrica, em Toyoake, onde também opero torno, mas as máquinas são todas robotizadas.Meu trabalho atual é mais leve, exige mais esforço mental do que físico. Minha experiência com torno no emprego anterior certamente me ajudou a conseguir a vaga. Meu trabalho consiste em programar as máquinas, regular as trocas de ferramentas e zelar pela manutenção das mesmas, para que as medidas das peças estejam sempre dentro dos padrões.Controlo várias máquinas numa linha de produção de peças para ar-condicionado de automóveis. Se alguma máquina aponta alguma irregularidade, um alarme é automaticamente acionado para que eu verifique o que há de errado e faça a devida manutenção. É um trabalho leve, mas que exige muita responsabilidade e concentração, principalmente porque outros funcionários dependem do meu desempenho para poder ter um bom rendimento.Tive uma experiência ruim no Japão e acho importante relatar. Fiquei 15 anos no mesmo emprego e, em função do trabalho, tive hérnia de disco. Fiz uma cirurgia e, quando me recuperei dela, soube que estava demitido.Foi uma situação chata, porque sempre trabalhei corretamente e nunca faltei sem motivo. Mas tirei desta situação uma lição que quero transmitir aos brasileiros: recomendo que todos sejam dedicados no trabalho, sim, mas que não o coloquem acima de todas as coisas. Acho mais importante priorizarmos a saúde e a família, e não o trabalho. Também recomendo que aqueles que não entendem o idioma japonês procurem aprender pelo menos o básico de conversação e a leitura de hiragana e katakana. E também que procurem entender e respeitar as diferenças culturais existentes entre Brasil e Japão, que sejam sempre educados com os japoneses. Isso tudo vale muito aqui e são fatores que me ajudaram a conseguir um bom emprego. Para quem só reclama do trabalho, digo que existem vagas que exigem menos esforço físico e valorizam mais os conhecimentos adquiridos. Basta se esforçar para chegar lá.No momento, não penso em ir ao Brasil. Sou divorciado, mas me relaciono bem com minha ex-esposa, que cuida de nossos dois filhos, um de sete e outro de nove anos. Eles estudam em escola japonesa, mas também falam português perfeitamente e se orgulham de ser brasileiros. Quero esperar até que cresçam e continuar poupando economias para, um dia, voltar ao Brasil com condições de descansar numa boa. Mas, por enquanto, vou continuar aqui.